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sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011


O Pato Paco

Ilustração: Guilherme Arruda
 
O Lago Azul possuía as águas mais azuis que se possa imaginar no mundo, e em suas margens, onde pequenas ondas vinham passear calmamente, levantavam-se algumas árvores altas, mas leves, que produziam uma sombra suave e agradável. O solo era coberto por uma relva baixa e pontilhado por minúsculas flores.
Nesse ambiente tão especial vivia o pato Paco, em uma casinha de madeira, com flores nas janelas e porta colorida. Paco era muito feliz. Como o único morador das beiras do Lago Azul, ele aproveitava todos os privilégios oferecidos.
Todos os dias, acordava logo ao amanhecer, se espreguiçava e abria a porta de sua casa. Deparava-se com uma vista estonteante das águas do lago iluminadas pela luz pálida do sol nascente. A primeira coisa que fazia, então, era pegar seu regador, embaixo da janela, e enchê-lo no lago. Regava suas flores, que eram de vários tipos e de muitas cores. Conversava um pouco com elas, sempre desejando que se mantivessem vivas e bonitas.
Logo depois, Paco pegava sua toalha, fazia um breve alongamento e partia para sua natação diária no lago. Como era bom esse momento! Ia entrando devagarzinho no lago, molhando as penas e chacoalhando o rabinho. Era uma felicidade!
Ele nadava por todo o lago, de um lado para o outro e brincava sozinho, mergulhando e batendo as asas.
Paco tinha um amigo não muito longe dali: o tatu Tutu. O tatu Tutu morava um pouco mais longe do lago, em uma pequena elevação no campo. Tutu era agricultor e, juntamente com Patrício, um carneiro gordo que tinha uma fazendinha naquela área, cultivavam milho e feijão. Esses alimentos eram, depois, distribuídos para toda vida animal local.
Regularmente, Paco visitava Tutu. A entrada de sua casa era um buraco no topo da colina, que se abria em um túnel e levava para um grande cômodo. Lá, Tutu havia colocado uma mesinha redonda, com cadeiras, armários cheios de provisões e até uma caminha, onde ele dormia com um cobertor de lã. Fazia muito frio embaixo da terra.
Paco e Tutu eram muito amigos e conversavam sobre tudo. E tudo ia muito bem na vida de ambos, até as coisas mudarem de rumo.
Um belo dia, após acordar, Paco regara suas flores e já se preparava para a natação, quando ouviu um som estranho vindo do céu. Afastou-se um pouco das árvores a fim de ter uma visão melhor e viu vários pontinhos negros se aproximando, como se realmente estivessem vindo para o Lago Azul.
Paco ficou sobressaltado. O que seria aquilo? Na expectativa, esperou com o bico aberto para ver o que acontecia. Os pontos negros mostraram, em sua rota, que realmente se dirigiam para o Lago Azul. E, conforme foram se aproximando, Paco pôde aos poucos distinguir sua natureza. Era um grupo de gansos.
Qual não foi sua surpresa! E sua decepção! De repente, ele viu seu lago exclusivo dominado por usurpadores! Paco não podia deixar isso acontecer. Assim que os gansos pousaram, fazendo o maior estardalhaço, Paco correu até eles:
- Senhores, senhores, bom dia! – disse sorrindo, porém altamente contrariado. – Como vão, fizeram uma longa viagem?
Os gansos, na balbúrdia que criavam, nem ouviam as palavras de Paco. Mas o pato se fez ouvir, abordando cada ganso e dizendo:
- Oi, pessoal, pessoal, vamos ouvir aqui, um pouquinho – disse, com um sorriso sem graça. Os gansos, finalmente, prestaram atenção em Paco e com muita dificuldade conseguiram se colocar em certa ordem, o suficiente para ouvirem o pato.
Paco, então, começou:
- Senhores, sejam bem-vindos ao Lago Azul, onde EU, Paco, moro há tantos anos. Espero que vocês aproveitem o POUCO tempo que terão aqui, e eu, como ÚNICO morador, estou a sua disposição para o que precisarem...
Os gansos não entendiam muito bem o que Paco estava dizendo. Mas um deles se pronunciou:
- Olá, Paco, como vai? Meu nome é Quácto. Fizemos uma longa viagem até aqui, de fato. Foram alguns dias inteiros para chegarmos. Mas, agora, podemos descansar. Na verdade, não pretendemos ir embora tão cedo, e sim nos estabelecermos aqui permanentemente, ou ao menos por um bom tempo. Essa é uma região quente, nem precisaremos partir quando o inverno chegar. Mas agradecemos muito sua ajuda! – E Quácto já foi encerrando a conversa, para desespero de Paco.
Os gansos eram muitos, e ficou difícil Paco fazer frente a eles. Qual não foi sua dor ao ver aqueles usurpadores tomando conta de seu espaço. Sentindo-se impotente, o pato correu o mais rápido que pôde até a casa de Tutu, para desabafar com o amigo e, de repente, pensarem os dois em uma solução para esta situação desastrosa.
Tutu estava no campo, cuidando de seus milhos. Quando viu Paco voando e correndo esbaforido em sua direção, tomou um susto, pensando o que poderia ter acontecido a ele de tão grave assim. Paco, assim que alcançou o amigo, gritou:
- Invasores! Usurpadores! Turba de animais!
Tutu arregalou os olhos:
- O que aconteceu, Paco? Diga!
Paco, como perdendo as forças de repente, começou a despencar, só não caindo no chão graças a Tutu, que tentava segurá-lo de todas as maneiras. O pato falou com voz chorosa:
- São aqueles gansos, gansos horrorosos, gordos e barulhentos! Eles chegaram sabe-se lá de onde, para tomar conta de meu lago! MEU LAGO! Como poderei viver com isso? Diga-me, Tutu, diga-me!
O tatu, que a bem da verdade não estava entendendo nada, tentou acalmar o amigo:
- Acalme-se, Paco, por favor, e me explique direito essa história.
Então, dando um raminho de erva-doce que trazia no bolso a Paco, a fim de sossegá-lo, Tutu novamente pediu que lhe contasse o acontecido. Paco, mascando o raminho de erva-doce e derramando lágrimas ao mesmo tempo, contou a Tutu tudo desde o começo, quando vira os pontinhos negros no céu. E concluiu:
- Percebe, agora, amigo Tutu, o porquê de meu desespero? Minha vida acabou, é o fim de meu sossego, de minha felicidade! Como poderei praticar minha natação todas as manhãs, com uma cambada de gansos desorganizados se espalhando por todo o meu lago? Como encontrarei paz para ler um bom livro com o barulho ensurdecedor que eles fazem? E meu sono, ah, meu sono! Será altamente prejudicado! Esses gansos não têm limites, eles dormem tarde, ficam gritando a noite inteira, como se fossem corujas! Ah! – E, novamente sentindo fortes emoções, Paco se esborrachou no chão, desta vez sem dar tempo ao amigo de segurá-lo.
Tutu acudiu o pato rapidamente, mas, estando Paco mais mole que uma gelatina, achou melhor mantê-lo no chão sentado. Ao mesmo tempo, já preocupado com a reação tão exagerada do amigo, olhava em volta à procura de alguém que pudesse ajudá-lo na situação.
Foi quando viu Patrício arando a terra não muito longe dali.
- Patrício! – gritou Tutu, - Patrício!
O carneiro ouviu os gritos e encostou o arado no chão, tentando descobrir de onde vinham. Viu, enfim, Tutu a alguns metros dali, abaixando-se sobre algo no chão. O carneiro, já estafado pelo trabalho e morrendo de calor devido a suas lãs, se dirigiu devagar ao local.
Chegando perto, disse:
- Fale, amigo Tutu, o que se passa?
- Patrício, ajude-me aqui com meu amigo Paco, que tem uma crise daquelas.
- Crise? Por quê? – Patrício era um carneiro bem calmo, e nunca entrava em crise.
Paco se encontrava meio desmaiado ainda, e mal prestava atenção a essa conversa. Tutu resumiu o caso de Paco para Patrício. O carneiro, como era o esperado, não entendeu o motivo da crise. Qual era o problema, afinal? Tutu explicou como Paco era, e demorou até Patrício conseguir conceber que algo tão simples se configurava, para o pato, como um desastre.
Nesse meio tempo, Paco já se ia levantando. Patrício e Tutu conseguiram convencê-lo, enfim, de que o fato não era tão grave assim, e que ele podia ficar sossegado, pois às vezes as coisas não são tão ruins quanto parecem. De repente, completou Tutu, os tais dos gansos poderiam até se mostrar amigos.
Não muito convencido, mas um pouco mais calmo, Paco concordou em voltar para o lago e enfrentar sua nova realidade. Foi caminhando devagar, cabisbaixo, como que com medo do que iria encontrar.
Tomou a trilha de sua casa, um caminhozinho de terra por entre as árvores. Quando pôde ver as águas do lago, Paco já esperava encontrar ao menos uma dúzia de gansos, a se espalhar e a fazer bagunça. Porém, os gansos estavam quietinhos em uma pequena baía do lago, a muitos metros de distância da casa de Paco.
Os gansos estavam grasnando, mas de forma comedida, e comiam pequenos mosquitinhos e frutinhas que caíam na água. Estavam todos tão juntinhos, que deixavam o lago livre, um belo espaço para Paco praticar sua natação.
Paco, nesse momento, deu razão a Tutu e a Patrício, segundo os quais as coisas muitas vezes não são tão ruins quanto parecem. De repente, já se imaginou levantando-se de manhã e, ao sair para nadar, cumprimentar os gansos, que abririam imediatamente o espaço necessário para Paco no lago, mantendo-se em silêncio para não atrapalhá-lo.
Os gansos, entretanto, pareciam nem se dar conta da presença de Paco, e seguiam suas vidas tranquilamente. O pato passou o dia dentro de casa, lendo e fazendo geléias, desconfiado, sem conseguir se concentrar totalmente, pois se dirigia à janela a cada dez minutos para checar o que os gansos estavam fazendo.
Porém, encolhidos do outro lado do lago, os gansos não deram o menor motivo de desgosto a Paco. Lá pelas seis horas da tarde, Tutu, preocupado com o amigo, resolveu fazer-lhe uma visita, e foi bater na porta de Paco. O pato abriu a porta curioso, já imaginando encontrar um ganso a fim de arrumar confusão. Quando viu Tutu, desarmou-se:
- Olá, Tutu!
- Olá, Paco. Como está, amigo?
- Estou bem, estou bem. Porém...
- O que aconteceu? – perguntou Tutu ansioso, pois esperava problemas.
- Nada – respondeu Paco.
- Nada?
- Nada.
- Mas, então... Então, estávamos certos, Patrício e eu. Os gansos afinal não são tão maus assim.
- Ah, não sei – respondeu Paco, com sua desconfiança. – Não sei, não. Não acredito que tudo continuará desta forma, em paz. Talvez eles estejam apenas se adaptando, para depois começarem a baderna.
- Ai, Paco, como você é neurótico! Deixe você os gansos em paz! Por que você tem que ser o único com direitos de morar neste lago, ora bolas?
- Por que... – nesse momento, Paco foi interrompido por um grande barulho lá fora. Fez uma cara de assustado, arregalou os olhos para Tutu e arreganhou a porta, como se fosse o fim do mundo. O tatu o seguiu, chocado com a situação.
Do lado de fora, no meio do lago, estavam os gansos, fazendo uma roda. Sua brincadeira era de tiro ao alvo: um ganso lançava uma bola ao ar, e outro ganso deveria pegar a bola o mais rápido possível, ainda no ar. Essa atividade causava o maior estardalhaço, pois enquanto o ganso da vez voava até a bola, os outros, no lago, gritavam, incentivavam, batiam as asas na água de excitação.
Paco, ao ver o que se passava, primeiramente se desesperou, mas logo sua expressão mudou e ele olhou para Tutu, como querendo dizer: “Eu sabia! Não te falei?”. E saiu em posição de ataque em direção aos gansos.
Tutu, no entanto, mais equilibrado, puxou Paco pelo rabo, impedindo-o.
- O que foi?! – perguntou Paco, bravo.
- O que você vai fazer? – perguntou Tutu. – Arranjar briga com cinquenta gansos? Enfrentá-los sozinho? Não, meu amigo, essa não é uma atitude inteligente!
- Mas então, o que eu devo fazer?
Tutu pensou um pouco e, como quem tem a melhor ideia do mundo, disse:
- Você deve consultar o Sr. Grilo!
- Não... Aquele charlatão? Não!
- Mas, Paco, você sabe que ele tem poderes! Muitos bichos escutam suas palavras e admitem sua sabedoria! Se você conseguir com que ele fique do seu lado, toda a comunidade ficará também, e talvez você consiga se livrar dos gansos.
Paco pensou bem e no fundo de sua consciência admitiu a verdade das palavras do tatu.
- Hmmm... Bom, - disse ele, a contragosto, - se não há outro jeito, vamos, falemos com esse falsário.
E lá se foram os amigos, em direção à casa do Sr. Grilo. Quando chegaram já era noite. A casa do Sr. Grilo era um buraquinho em uma árvore grande, com uma portinha e uma janelinha. Olhando para dentro pela janela, Tutu pôde ver que o grilo jantava.
- Bem, paciência, nosso assunto é urgente. E bateu na porta.
O grilo interrompeu sua sopa, tirou o guardanapo de debaixo do queixo e abriu a porta.
- Oh, olá senhores, como vão?
- Olá, Sr. Grilo, como vai o senhor? – disse Tutu. – Nós temos um problema sobre o qual gostaríamos de consultá-lo.
- Mas, claro, claro – disse o grilo, assumindo um ar sério. Vamos nos reunir na mesa do conselho, em dez minutos.
A mesa do conselho era um toco cortado logo ao lado da casa do grilo, iluminado por um lampião. Tutu e Paco se sentaram ao redor do toco que fazia as vezes de mesa e esperaram. O Sr. Grilo, após terminar de tomar sua sopa e escovar os dentes, saiu pulando de casa e foi se reunir aos dois amigos.
- Muito bem, vamos ao problema! – disse ele, se pondo à escuta. Como Paco estava altamente contrariado com a situação, devido tanto aos gansos quanto ao fato de estar consultando o grilo, foi Tutu quem assumiu a palavra e contou todo o caso ao Sr. Grilo. Este, após o fim do relato, pôs-se a pensar.
- Hmmm... – disse ele. E ficou mais dez minutos quieto. Então, levantou um dedo, como se fosse dar a sentença final, mas apenas fez “Hmmm” novamente.
Paco já estava quase voando por cima da mesa e esganando o grilo, quando ele finalmente falou.
- Pois bem, senhores, vejam só qual é minha opinião sobre este caso curioso e complexo. Sabemos que o Sr. Paco vive no lago há já muitos anos, e é o único morador de tais águas.
- Sim – concordou prontamente Paco. – Exatamente.
- Pois é – completou o grilo. – Porém, - continuou ele, e nesse momento Paco se pôs em alerta, - ninguém estabeleceu em nenhum momento que o lago lhe pertencia – “O quê?!”, gritou Paco -, e por isso - continuou o grilo, ignorando a reação violenta do pato -, acredito que não há nada a ser feito em relação aos gansos, pois que eles têm todo o direito de se alocarem lá. Essa é minha sentença.
E saiu pulando de volta para sua casa, sem mais nem menos.
Paco deu um urro de ódio:
- Seu grilo charlatão! Eu falei que não tínhamos nada que vir aqui, falar com esse grilo bocó!
Não houve como acalmar Paco, que saiu bufando e batendo os pés pelo campo, e deixou Tutu para trás. O tatu, pesaroso por ter ocasionado a nova crise, foi para casa torcendo para que aquele caso terminasse bem.
Nesse meio tempo, Paco não sabia o que fazer. O lago, seu lar tão querido, não era mais um refúgio, após a invasão dos gansos. E agora sua única expectativa de resolver o problema havia se mostrado totalmente infundada, após a decisão adversa do grilo.
Baratinado, o pato acabou errando o caminho de volta para casa e enveredou por uma trilhazinha escura que seguia através de uma floresta, sem perceber que seres mais sombrios o observavam. Quando se deu conta, estava cercado por árvores altas emaranhadas com cipós, onde mal podia enxergar alguns metros a sua frente.
Paco ficou desesperado. Olhou para trás e não conseguiu mais encontrar a trilha que seguira até então. Estava perdido em meio a uma mata a altas horas da noite.
Então, sentiu algo gelado escorregando por seu pé. O pato deu um pulo e um grasnado, caiu a dois metros de distância e tentou ver o que provocara uma sensação tão estranha. Neste momento, um raio de luz da lua rompeu a barreira das árvores e Paco pôde distinguir, em meio ao solo de terra, gravetos e folhas da floresta, o vulto de uma enorme cobra indo em sua direção.
Desesperado, Paco tentou voar para longe, mas a cada tentativa se enroscava nos cipós e caía de volta no chão. Não conseguia mais enxergar a cobra devido à escuridão, mas ouvia os galhos caídos estalarem conforme ela se movia, pronta para atacá-lo. O pato já se imaginava na barriga do bicho, sendo lentamente digerido. Horrorizado pela visão, Paco deu um último grasnado. A cobra o alcançara.

Ilustração: Tácia Soares

Sentiu o corpo gelado da cobra se enrolando ao seu redor, preparando o abraço fatal. Nesse momento, Paco teve a impressão de ouvir um som distante, conhecido, que lhe causava certa raiva mas que, em tal situação, trazia-lhe uma espécie de alívio. À medida que o abraço da cobra ficava mais apertado, mais nitidamente Paco ouvia o som, até se tornar tão claro que não havia mais dúvidas. Eram os gansos.
Paco gritou o mais forte que pôde por ajuda, com esforço, pois já se sentia sufocado pela cobra. Lá em cima, um dos gansos da ponta do bando ouviu o grito de Paco, e foi até Quácto comunicá-lo:
- Quácto, você ouviu esse grito?
Quácto ia responder quando ouviu outro grito vindo do fundo da floresta. Imediatamente, mudou a direção do voo do bando e gritou:
- Amigos, algum companheiro nosso precisa de ajuda! Vamos acudi-lo!
Todos os gansos arremeteram em direção às árvores, rompendo a barreira de suas copas até o chão. Chegaram no exato instante em que a cobra se preparava para dar um fim em Paco. Sem combinarem nada, os gansos começaram a bicar a cobra em todas as partes de seu corpo, vorazmente, formando um redemoinho de gansos. A cobra, pega de surpresa por um ataque tão forte, logo desistiu de sua presa, afrouxando o aperto. Desenrolou-se e saiu fugida. Os gansos, porém, ainda continuaram a bicá-la até que desaparecesse por completo de uma boa distância. Então, voltaram para verificar o estado em que Paco se encontrava.
O pato desfalecera, tanto pela falta de ar quanto pelo desespero. Porém, ainda vivia. Os gansos recolheram-no e o levaram de volta para o lago, onde o repousaram em sua cama.
Paco acordou no dia seguinte com o sol batendo em seu rosto. No criado-mudo a seu lado, havia uma jarra de vidro com água fresca. O pato levantou-se devagar. Alguém o cobrira com um cobertor macio. Paco foi até a janela e, quando abriu as venezianas, deparou-se com suas tão queridas flores, vívidas e vibrantes; elas haviam sido regadas.
Paco levou uns bons minutos para se recordar do que acontecera na noite anterior. Apenas se lembrava de estar perdido na floresta, de ser atacado por uma cobra enorme; depois disso, imagens de uma confusão de penas, de alguém o carregando passavam por sua mente, de forma embaraçada. Agora, estava de volta a sua casa. O que havia acontecido?
De repente, bateram em sua porta. O pato abriu-a desconfiado. Era Tutu.
- Olá, meu amigo, como está? – perguntou ele.
- Bem... – respondeu Paco, ainda desnorteado. – Porém, não saberia dizer exatamente o que ocorreu, você poderia me ajudar, Tutu?
- Você não se lembra? – perguntou o tatu, espantado. Diante da negativa de Paco, ele explicou: - Não sei por qual motivo (isso só você sabe dizer), após nossa reunião com o Sr. Grilo você se decidiu a tomar o caminho da floresta de volta para casa (todos sabemos que esse é um caminho muito perigoso, realmente foi loucura sua). Lá, você foi atacado pela cobra sucuri, de quem todos temos medo. Por muita sorte, enquanto você era espremido e quase morto pelo monstro, os gansos estavam dando um passeio noturno, e ouviram seus gritos. Eles o salvaram, trouxeram-no de volta para sua casa e cuidaram de você até agora; eu cheguei há pouco, pensando que você estaria chateado, sem nem imaginar que nossa conversa de ontem poderia ter consequências tão graves.
Paco ficou sem palavras. Os gansos, de quem tanto reclamara, no fim haviam sido seus salvadores. Então, o pato saiu de sua casa e viu os gansos nadando tranquilamente no lago, tal como ele mesmo faria. E percebeu que os gansos eram assim como ele e que, afinal, era uma boa coisa ter vizinhos.
Paco correu para o lago a se encontrar com aqueles que seriam seus novos amigos, e nunca sua natação havia sido tão divertida.